O site Confraria- revista e literatura publicou  poemas de STELA DO PATROCÍNIO, paciente psiquiátrica , nascida em 1941, internada por 30 anos na colônia Psiquiátrica Juliano Moreira. A riqueza das fabulações de Stela impressionou a artista plástica Neli Gutmacher. ” Interna desde 1962, Stela se destacava dos outros pacientes por sua fala peculiar, com alto teor poético. Algumas de suas falas foram gravadas em fitas cassetes e, quase quinze anos depois, foram transcritas, organizadas em forma de poesia e reunidas em livro pela escritora Viviane Mosé. “Reino dos bichos e dos animais é o meu nome” atingiu tal repercussão que, em 2002, tornou-se finalista do Prêmio Jabuti e, em 2005, levou a fala de Stela a ser transformada em ópera pelo compositor Lincoln Antonio. Apesar de amplamente divulgados e acolhidos com entusiasmo por poetas e intelectuais, seus poemas permanecem relativamente desconhecidos do público em geral, talvez pela falta de uma divulgação pública das gravações, ou de uma nova edição com a transcrição integral de sua fala.”( extraído do site)
Os poemas de Stela , que tinha diagnóstico de esquizofrenia, trazem em linguagem sintética angústias da alma humana. Carl jUng descreveu dois tipos de pensamento: O sintético e o analítico. O pensamento sintético é a linguagem dos símbolos e não segue as regras da lógica formal. no pensamento sintético assim como no inconsciente um objeto ou uma imagem, podem agregar múltiplas significações. Alguém pode ser  representante do bem e do mal simultâneamente. Da mesma forma , aspectos da realidade externa reunidos ou justapostos podem sintetizar uma idéia ou uma emoção. Nos poemas de Stela , a noção de realidade se amplifica. Em sua realidade subjetiva , fragmentos, retalhos , pequenas percepções constituem síntese que nos toca  a cada momento e descreve muitos de nossos sentimentos: O sentido de pertencer ou não a uma mesma realidade, o espaço de vida e o espaço de morte, a questão da liberdade e da identidade.

Em seguida, alguns dos poemas:

” É dito: pelo chão você não pode ficar

Porque lugar da cabeça é na cabeça

Lugar de corpo é no corpo

Pelas paredes você também não pode

Pelas camas também você não vai poder ficar

Pelo espaço vazio você também não vai poder ficar

Porque lugar da cabeça é na cabeça

Lugar de corpo é no corpo

*

Olha quantos estão comigo

Estão sozinhos

Estão fingindo que estão sozinhos

Para poder estar comigo

Eu já fui operada várias vezes

Fiz várias operações

Sou toda operada

Operei o cérebro, principalmente

Eu pensei que ia acusar

Se eu tenho alguma coisa no cérebro

Não, acusou que eu tenho cérebro

Um aparelho que pensa bem pensado

Que pensa positivo

E que é ligado a outro que não pensa

Que não é capaz de pensar nada e nem trabalhar

Eles arrancaram o que está pensando

E o que está sem pensar

E foram examinar esse aparelho de pensar e não pensar

Ligados um ao outro na minha cabeça, no meu cérebro”

O sentimento de solidão e o instinto gregário aparecem nos poemas  como  manifestação do desejo e não como necessidade.

Querer estar junto ou necessitar estar junto? Stella traz esse dilema profundo do ser humano, entre outros.

A psiquiatra Nise da Silveira também estudou a riqueza do inconsciente em pacientes psicóticos através  de suas pinturas e desenhos. Para Jung a psicose é a invasão da consciência por conteúdos do inconsciente. O fato da consciência não conseguir elaborar os conteúdos, não invalida a riqueza simbólica dos mesmos. Temos ainda muito que aprender sobre a mente humana , “esse aparelho de pensar”como disse Stella.

“O símbolo não é uma alegoria nem um Semeion ( sinal) mas a imagem de um conteúdo em sua maior parte transcedental ao consciente. É necessário descobrir que tais conteúdos são reais, são agentes com os quais um entendimento não só é possível mas necessário. Com este descobrimento compreender-se-á  então do que trata o dogma, o que êle formula e a razão de sua origem.” ( Jung Carl G -Símbolos da transformação- par. 114)

A noção de símbolo aparece na Psicologia Analítica  de Jung atrelada a um outro conceito- o de função transcendente que designa a   capacidade da mente de simbolizar não só em termos de seu conteúdo mas de sua função. Cria transições de uma atitude para outra , de um estado existente da experiência para outro ou de um estágio de desenvolvimento para outro.  O analista nessa perspectiva tem a função de mediador , ou seja, de continente de sentimentos e emoções que o ego do paciente não consegue reintegrar.  A capacidade de experenciar simultaneamente o eu e o não eu define a matriz do pensamento reflexivo. A função simbólica envolve a experiência da representação devido a experiência do “como se” ao invés da identificação e  do reconhecimento das semelhanças em objetos que são ao mesmo tempo vistos como existências separadas.

A capacidade de simbolizar pode ser desarticulada e impedida se certas condições de desenvolvimento não estiverem presentes.

O jogo simbólico é o predecessor  do trabalho criativo.

O jogo define a área da experiência onde a experiência sensorial encontra a atividade imaginativa – o jogo com atividades emocionais.  Nessa área se constrói o espaço da análise.

A necessidade de dar  ordem e sentido às vivências emocionais encontra expressão na criação e descoberta de formas de relacionamento entre analista e cliente. O processo analítico une processos cognitivos e emoção. A técnica é construída a cada momento e com cada paciente. Nesse sentido psicoterapia é também arte. É um espaço ritual importante para a integração de sentimentos e de aspectos da personalidade.

Como em um rito se caracteriza também pela repetição da cena principal, a sessão de análise. Nesse sentido, toda sessão de análise é um ritual simbólico. A criatividade está no “como se” da atividade imaginativa que a cada experiência transforma os sujeitos, analista e cliente.

Os ritos de iniciação costumam conectar o simbolismo de morte e renascimento.  Nesses rituais em que o neófito fica recluso,  simula-se seu incineramento em lugar fechado, como uma cova, e, posteriormente, este reaparece como que vomitado da boca de um monstro. Deve sofrer, morrer e ressuscitar. De forma análoga , esse processo ocorre quando nos propomos a um mergulho no desconhecido de nós mesmos.

A análise e a psicoterapia se afastam do alvo do ajustamento.  Apesar disso, não podemos enganar o processo criativo aceitando a desorientação como inevitável precursora da inspiração.  Nesse domínio de realidade, imagens e temas arquetípicos são deintegrados  da matrix indiferenciada do self. Não foram ainda re – integradas no ego e criam estados de desintegração  até que sejam assimiladas.

O criativo em psicologia não age exclusivamente dentro dos limites de uma pessoa, dos processos simbólicos e vivências de uma individuação particular. A criatividade psicológica toma o próprio indivíduo e a comunidade como obra a ser realizada. Desse fato  o papel criativo e a responsabilidade social de um analista.

Platão e o amor

11/07/2010

A história do amor e da sexualidade é expressiva das transformações sociais mais amplas.

No texto O banquete de Platão temos a formulação do conceito de belo, de verdade e de virtude como a busca do divino que se aparta do carnal e dos prazeres mais simples do homem.  A deusa Pandêmia é a inspiradora dos amores carnais, vulgares e comuns e Urânia é a deusa que não tem mãe, inspiradora de um amor etéreo, superior e imaterial, através do qual se atinge um amor supremo, como Diotima revelou a Sócrates.

Diz Platão:

“Que devemos pensar de um homem ao qual tivesse sido dado contemplar a beleza pura, simples, sem mistura, a beleza não revestida de carne, de cores e de outras coisas mortais e sem valor- mas a beleza divina?”

Desse texto a famosa expressão amor platônico ou etéreo ausente dos prazeres da carne.

Da mesma maneira aparece na Epístola do apóstolo Paulo aos Coríntos o amor de dileção preservado das paixões humanas.

Na idade Média os místicos alimentaram a fantasia de sacrificar o corpo e oferecê-lo a Deus.

Os libertinos e Sade elegeram o corpo como o único lugar do gozo opondo-se ao cristianismo que havia  eleito a alma. O nome do Marques de Sade se tornou substantivo para designar o inimigo do próximo, de si e da nação.

Prosseguindo com  história das relações amorosas e das práticas sexuais, é importante lembrar que no século XII o casamento foi sacramentado em uma estrutura patriarcal e ainda de bases feudais, em que a mulher passava no casamento da condição de propriedade da família e de seu pai para a reclusão do casamento indissolúvel  e da autoridade do marido.

O sexo era um dever a ser cumprido no casamento e tinha o compromisso da procriação. A mulher que não correspondesse a essas expectativas era devolvida para o pai ou para a familia e muitas viam apenas no convento a saída para o sofrimento de sua condição feminina . As dissociações entre a mente e o corpo, entre o sagrado e o profano, entre o amor e a sexualidade eram, então, expressivas.

Platón y el amor

La historia del amor y de la sexualidad es expresiva de las transformaciones sociales más amplias.

En el texto El banquete de Platón tenemos la formulación del concepto de bello, de verdad y de virtud como la búsqueda del divino que se aparta del carnal y de los placeres más sencillos del hombre.

La diosa Pandemia es la inspiradora de los amores carnales, vulgares y corrientes y Urania es la diosa que no tiene madre, inspiradora de un amor etéreo, superior e inmaterial, a través del cual se alcanza el amor supremo, como Diotima se lo reveló a Sócrates.

Dice Platón :

“¿Qué debemos pensar acerca de un hombre al que le hubiera sido dado contemplar la belleza pura, simple, sin mezcla, la belleza no revestida de carne, de colores y de otras cosas mortales y sin valor- sino la belleza divina?   

De ese texto la famosa expresión amor platónico o etéreo sin los placeres de la carne.

De la misma manera consta en la  Epístola del apóstol Pablo a los Corintos, el amor de dilección, el amor ágape, preservado de las pasiones humanas.

En la Edad Media los místicos defendieron la fantasía de sacrificar el cuerpo y  ofrecérselo  a Dios.

Los libertinos y Sade eligieron el cuerpo como el único lugar del goce oponiéndose al cristianismo que había elegido el alma. El nombre del Marqués de Sade se tornó sustantivo para designar al enemigo del prójimo, de si y de la nación.

Prosseguindo com  a história das relações amorosas e das práticas sexuais, é importante lembrar que no século XII o casamento foi sacramentado em uma estrutura patriarcal e ainda de bases feudais, em que a mulher passava no casamento da condição de propriedade da família e de seu pai para a reclusão do casamento indissolúvel  e da autoridade do marido.

Dando continuidad a la historia de las relaciones amorosas y de las prácticas sexuales, es importante recordar que en el siglo XII el matrimonio fue sacramentado en una estructura patriarcal y aún de bases feudales, donde la mujer pasaba en el matrimonio de la condición de propiedad de la familia y de su padre hacia la reclusión del matrimonio indisoluble y de la autoridad del marido.

El sexo era un deber a cumplirse en el matrimonio y tenia el compromiso de la procreación. La mujer que no correspondiera a esas expectativas era devuelta al padre o  a la familia y muchas veían solo en el convento la salida para el sufrimiento de su condición femenina. Las disociaciones entre la mente y el cuerpo, entre el sagrado y el profano, entre el amor y la sexualidad eran, entonces, expresivas. 

 

Nícolas Brandão

“será mesmo incrível o tal do polvo?
ou a fama é que faz um cefalópode?
quando prevejo, será que vejo? …
quando vejo será que falo? Será que pode?
e se disser, serei também um ser-falópode?

crê-se que o polvo vê, daí vidente.
vidente porque vê à frente.
se o polvo vê, porque é que mente?

será o destino a vitória do um sobre o outro?
Não será pouco?

me diz, então, meu caro Paul,
quando essa Copa já tiver sido,
e a disputa houver regressado
do campo para o espírito humano,
quem prevalecerá nessa batalha?

afinal, somos como você,
embora muito mais tristes.
exautamos os grandes campeões,
emprestamos deles as vitórias,

mas seguimos arrastando o cérebro entre os corais.”

O poema de Nícolas traz a dimensão simbólica do evento que circulou na mídia sobre o polvo vidente alemão. O autor diz de maneira sábia que “seguimos arrastando o cérebro entre os corais”, ou seja, retornamos várias e muitas vezez para nosso potencial arquetípico e para as imagens do inconsciente. Nada melhor do que um polvo de muitas pernas para representar esse evento mundial que ocorre em diferentes arenas, “caixas”, campos de futebol onde cada time será tragado da sua vez. Mas é interessante a imagem: O time vencedor será aquele em cuja caixa estará a comida do polvo. Que animal voraz é esse evento Copa do Mundo ! E sàbiamente pergunta Nícolas para onde irá o desejo de disputa humano…

Ausência

07/07/2010

 

Visita

 Ferreira Gullar 

No dia de finados

 ele foi  ao cemitério

porque era o único

lugar do mundo onde

  podia estar

 perto do filho  mas

 diante daquele

  bloco negro

 de pedra

entendeu

impenetrável

 que nunca mais

 poderia

 alcançá-lo

  apanhou do chão um

 pedaço amarrotado

 de papel escreveu

 eu te amo filho

 pôs em cima do  

mármore sob uma flor

 e saiu

Soluçando

Ferreira Gullar .

  Ferreira Gullar destaca o caráter intangível da emocão da perda e  do luto. A perda da possibilidade de contato físico com o morto,  confere ao pensamento a tarefa e única possibilidade de ressuscitar e matar o objeto de amor na  vivência emocional, percorrendo um caminho do sentimento de ausência até a vivência mais plena da morte.

    Segundo Winnicott : “Manipular a ausência, é alongar esse momento, retardar tanto quanto possível o instante em que o outro poderia oscilar sêcamente da ausência à morte.”

Ausencia

04/07/2010

Visita

Ferreira Gullar

No dia de finados

ele foi ao cemitério

porque era o único

lugar do mundo onde

podia estar

perto do filho  mas

diante daquele

bloco negro

de pedra

entendeu

impenetrável

que nunca mais

poderia

alcançá-lo

apanhou do chão um

pedaço amarrotado

de papel escreveu

eu te amo filho

pôs em cima do

mármore sob uma flor

e saiu

Soluçando

Ferreira Gullar .

Ferreira Gullar destaca el carácter intangible de la emoción de la pérdida y del luto. La pérdida de la posibilidad de contacto físico con el muerto, le confiere al pensamiento la tarea y única posibilidad de resucitar y matar el objeto de amor en la vivencia emocional, recorriendo un camino del sentimiento de ausencia hasta la vivencia más plena de la muerte.

Según Winnicott : “Manipular la ausencia, es alargar ese momento, retardar tanto como posible el instante en que el Otro podría oscilar secamente de la ausencia a la muerte.”