Psicoterapia e Criatividade
22/07/2010
“O símbolo não é uma alegoria nem um Semeion ( sinal) mas a imagem de um conteúdo em sua maior parte transcedental ao consciente. É necessário descobrir que tais conteúdos são reais, são agentes com os quais um entendimento não só é possível mas necessário. Com este descobrimento compreender-se-á então do que trata o dogma, o que êle formula e a razão de sua origem.” ( Jung Carl G -Símbolos da transformação- par. 114)
A noção de símbolo aparece na Psicologia Analítica de Jung atrelada a um outro conceito- o de função transcendente que designa a capacidade da mente de simbolizar não só em termos de seu conteúdo mas de sua função. Cria transições de uma atitude para outra , de um estado existente da experiência para outro ou de um estágio de desenvolvimento para outro. O analista nessa perspectiva tem a função de mediador , ou seja, de continente de sentimentos e emoções que o ego do paciente não consegue reintegrar. A capacidade de experenciar simultaneamente o eu e o não eu define a matriz do pensamento reflexivo. A função simbólica envolve a experiência da representação devido a experiência do “como se” ao invés da identificação e do reconhecimento das semelhanças em objetos que são ao mesmo tempo vistos como existências separadas.
A capacidade de simbolizar pode ser desarticulada e impedida se certas condições de desenvolvimento não estiverem presentes.
O jogo simbólico é o predecessor do trabalho criativo.
O jogo define a área da experiência onde a experiência sensorial encontra a atividade imaginativa – o jogo com atividades emocionais. Nessa área se constrói o espaço da análise.
A necessidade de dar ordem e sentido às vivências emocionais encontra expressão na criação e descoberta de formas de relacionamento entre analista e cliente. O processo analítico une processos cognitivos e emoção. A técnica é construída a cada momento e com cada paciente. Nesse sentido psicoterapia é também arte. É um espaço ritual importante para a integração de sentimentos e de aspectos da personalidade.
Como em um rito se caracteriza também pela repetição da cena principal, a sessão de análise. Nesse sentido, toda sessão de análise é um ritual simbólico. A criatividade está no “como se” da atividade imaginativa que a cada experiência transforma os sujeitos, analista e cliente.
Os ritos de iniciação costumam conectar o simbolismo de morte e renascimento. Nesses rituais em que o neófito fica recluso, simula-se seu incineramento em lugar fechado, como uma cova, e, posteriormente, este reaparece como que vomitado da boca de um monstro. Deve sofrer, morrer e ressuscitar. De forma análoga , esse processo ocorre quando nos propomos a um mergulho no desconhecido de nós mesmos.
A análise e a psicoterapia se afastam do alvo do ajustamento. Apesar disso, não podemos enganar o processo criativo aceitando a desorientação como inevitável precursora da inspiração. Nesse domínio de realidade, imagens e temas arquetípicos são deintegrados da matrix indiferenciada do self. Não foram ainda re – integradas no ego e criam estados de desintegração até que sejam assimiladas.
O criativo em psicologia não age exclusivamente dentro dos limites de uma pessoa, dos processos simbólicos e vivências de uma individuação particular. A criatividade psicológica toma o próprio indivíduo e a comunidade como obra a ser realizada. Desse fato o papel criativo e a responsabilidade social de um analista.
Como trazer de volta as borboletas
18/06/2010
Quando uma convivência conjugal termina as borboletas do frisson sentido no estômago do tempo da paixão dão lugar aos sentimentos ambivalentes de alívio de tensão e de luto. A neurociência propõe que o cérebro tende a buscar a situação de equilibrio anterior através da inslação das antigas sensações.
Mas hoje o que temos é um imediatismo na busca de satisfação. Dessa espiral de busca sem limites, expressa também na ânsia de consumo, vemos um movimento ascendente em direção ao mundo e descendente em direção ao sujeito.
Jung descreve o processo de individuação como um movimento em espiral, de progressões e regressões. Progredir e regredir aqui tem um sentido de compensação energética entre uma vivência e outra. Precisamos de um tempo para evoluir de um estado de consciência para outro. Restabelecer o equilibrio é apontar para algo novo. Não é voltar ao estado anterior da alma. Porém, regredir é também caminho para progredir. O grande desafio é reencontrar, em outro formato, a experiência de satisfação e a criatividade que diante do luto se arrefeceram.
Trazer de volta as borboletas do desejo , da alegria e da esperança exige um intenso trabalho psíquico. Não é suficiente encontrar um outro parceiro amoroso. O caminho do pleno gozo é o caminho de encontro consigo mesmo quando os humores da libido trazem de volta as borboletas.
O que é uma análise ?
28/07/2009
Foto de Mariana Brandão
Durante sua formação o analista realiza incursões profundas em seus afetos e se deixa afetar, influir pelo outro. Podemos entender esse outro como uma abstração, como parte da configuração psíquica de todo indivíduo, ou então, como o outro “de fato”, aquele que existe além de mim.
Cabe ao terapeuta a partir de suas experiências anímicas buscar a compreensão do outro. O que nos desafia é sempre a outra alma humana. As limitações estabelecidas pelo outro são sentidas em qualquer relacionamento ora como a gratificação e redenção ora como a tragédia da própria relação.
A forma de compreensão que temos de nossas vivências emocionais pode conduzir nossos desenvolvimentos para caminhos mais ou menos saudáveis.
É esse o papel do terapeuta e do analista: caminhar junto com seus pacientes como mediador da busca de uma melhor qualidade de comunicação com seu inconsciente e símbolos.
A esse caminho de auto-construção que se dá a partir da relação dialética entre consciência e inconsciente Jung chamou de processo de individuação.
Bem, mas trocando em miúdos, o que é análise mesmo ? Só passando por ela.